Deixaram boa memória as Madonas de Maria Speth, o No Country For Old Men dos Coen (que logo a seguir voltaram, com Burn After Reading, às tontices auto-destrutivas), alguns planos do Colombo de Oliveira, No Vale de Elah, a segunda metade de Sweeney Todd (a metade com vermelho), a tristeza auto-consciente do John Rambo, o par de Hou Hsiao Hsens, Nadine Labaki (mais ela do que o filme, Caramel), a neve dos Lobos (José Nascimento), Fernando Lopes a fazer tilintar o copo de whisky nos Lovebirds de Bruno de Almeida, o The Mist de Darabont (a verdadeira adaptação do Ensaio sobre a Cegueira), o Diário dos Mortos de Romero, os primeiros vinte minutos do Indiana Jones, A Rapariga Cortada em Dois (Chabrol), Wall-E, Gomorra, A Turma, Jim Carrey a encontrar em Zooey Deschanel a sua Nicoletta, a sua Masina, em Sim!. Tenho pena de ter perdido (estava de férias) a Tempestade Tropical de Ben Stiller, o trailer era promissor.
Monday, December 29, 2008
Top 11
Deixaram boa memória as Madonas de Maria Speth, o No Country For Old Men dos Coen (que logo a seguir voltaram, com Burn After Reading, às tontices auto-destrutivas), alguns planos do Colombo de Oliveira, No Vale de Elah, a segunda metade de Sweeney Todd (a metade com vermelho), a tristeza auto-consciente do John Rambo, o par de Hou Hsiao Hsens, Nadine Labaki (mais ela do que o filme, Caramel), a neve dos Lobos (José Nascimento), Fernando Lopes a fazer tilintar o copo de whisky nos Lovebirds de Bruno de Almeida, o The Mist de Darabont (a verdadeira adaptação do Ensaio sobre a Cegueira), o Diário dos Mortos de Romero, os primeiros vinte minutos do Indiana Jones, A Rapariga Cortada em Dois (Chabrol), Wall-E, Gomorra, A Turma, Jim Carrey a encontrar em Zooey Deschanel a sua Nicoletta, a sua Masina, em Sim!. Tenho pena de ter perdido (estava de férias) a Tempestade Tropical de Ben Stiller, o trailer era promissor.
Wednesday, December 24, 2008
Saudações da quadra
Sunday, December 21, 2008
Mulligan
Thursday, December 18, 2008
Billy's dead
Wednesday, December 17, 2008
New bands coming out of Athens, Georgia
Vi no jornal que Mike Mills faz hoje 50 anos. Isto já foi há muito, muito tempo, Peter Buck era magrinho e Michael Stipe tinha cabelo.
Meteorologia
(Um ex-soldado sulista, para um ex-soldado nortista, em The Outlaw Josey Wales, de Clint Eastwood)
Tuesday, December 16, 2008
O oposto da televisão
Saturday, December 06, 2008
Lágrimas e suspiros
Thursday, December 04, 2008
Bach unter uns
Ainda a Maria Félix
Riam-se dos Calaveras, riam-se do bigode do Pedro Armendariz, riam-se, riam-se...
Wednesday, December 03, 2008
O prazer
Tuesday, December 02, 2008
Mencken on film
Friday, November 28, 2008
Ombros
Thursday, November 27, 2008
Chuckie's grandfather
Saturday, November 15, 2008
O amor irregular
Wednesday, November 12, 2008
Les vieux
Saturday, November 01, 2008
Os faroleiros
Nas praias, nas ruas, nas salas de cinema
Mas um “legado” é sempre mais do que aquilo que se promove, é também aquilo que se gera involuntariamente, aquilo que aparece “em reacção”. E aí parece-me que há um legado Bush, que é um pouco mais do que o folclore de uma “cultura anti-Bush” porque tem a ver com os meios e com os modos. No que conheço melhor, o cinema, os últimos anos assistiram ao reaparecimento de uma tradição que estava por motivos vários bastante adormecida – o filme político, clara e declaradamente político. Provavelmente desde Nixon que não havia um presidente tão inspirador para os cineastas e argumentistas americanos. Mas mais do que isso – e eu não gosto particularmente de Michael Moore mas ele foi uma figura fundamental neste processo – reviveu-se a ideia de que o cinema tinha um papel a desempenhar no combate político, ser um instrumento, uma “arma”. Havia décadas, desde a generalização da televisão, que não se considerava o cinema assim nem se lhe atribuia este poder. As palavras exasperadas com que Gore Vidal critica W., o filme de Oliver Stone, são elucidativas: “Não precisamos de Freud quando estamos a lidar com Calígula”. Vidal censura Stone por se furtar, justamente, à dimensão combativa – o que é significativo das expectativas depositadas no cinema, no momento em que Bush abandona a presidência. Isto não pode ser dissociado do seu legado: We’ll fight them on the beaches, on the streets, mas também in the movie theaters.
Com sorte, o them é indeterminado.
Thursday, October 30, 2008
Necrologia
Transformar o corriqueiro em elegíaco, voila le (plus) beau souci.
Cavaleiros do asfalto
Monday, October 20, 2008
Guillaume
Também morreu Xie Jin, o realizador de um dos mais célebres filmes chineses que eu nunca vi, O Destacamento Vermelho Feminino, título como hoje já não há (e muito menos na China).
Tuesday, September 23, 2008
As coisas visíveis
Equivalências gratuitas
("Sintomaticamente", si j'ose dire, em 1992 La Règle desapareceu por completo; ah, a doce "nova cinefilia" de 90, e os seus ouvidos duros...) *
Sugestões (os DVDs que ando a ver e os que gostava de ver)
Monday, September 22, 2008
Sem piada nenhuma
Wednesday, September 03, 2008
O que Goebbels viu
Tuesday, September 02, 2008
As ondas de criminalidade violenta
Frase que não sei onde Godard foi desencantar e que se ouve, da boca de um polícia, em Prénom: Carmen.
(Estão aqui, de resto, outros adágios godardianos bastante divertidos, como esta análise do sistema capitalista ocidental, que cito de memória: "O capitalismo clássico concentrava-se na produção do que fosse ao encontro das necessidades básicas; mas a certa altura passou a dedicar-se à produção de objectos que não correspondem a nenhuma necessidade, como as bombas atómicas ou as tijelas de plástico"; ou ainda este diálogo entre Godard e um "jovem": - vocês não inventaram nada, nem os jeans, nem os cigarros, nada; - inventámos o desemprego, retorque o jovem; - talvez, mas foi sem o procurarem;
- il faut chercher)
Monday, August 25, 2008
Obliquamente
Ainda Mojica
Friday, August 22, 2008
José Mojica Marins
Isto, e mais o Zé do Caixão. Preparem-se para conhecer José Mojica Marins.
Jünger / Fuller
Parece a descrição de uma cena de um filme de Samuel Fuller (por exemplo, a do manicómio em The Big Red One), mas é uma passagem de um livro de Ernst Jünger, A Guerra como Experiência Interior. Que, por sua vez, é um título que parece a descrição dos war films de Fuller.
Thursday, July 31, 2008
Banalidade do Mal
John Carpenter.
Tuesday, July 29, 2008
His handkerchief in his eye
Pat Garrett & Billy the Kid, Dylan meets Sam Peckinpah, amanhã.
(se Sam Peckinpah teve que puxar do lenço quando ouviu Dylan cantar, eu não posso verter duas lágrimas num concerto do Leonard Cohen?)
Na cara não
O que me tinha espevitado foi a coincidência de ter visto o filme de Padilha dois ou três dias a seguir ao meu visionamento anual de Man Hunt. Eu sei, eu sei: tomara aos wildest dreams de Padilha que qualquer dos seus Bopes fosse tão assustador como a fera humana em que Walter Pidgeon se tornou nos últimos planos do filme de Lang (e isto independentemente da justiça da causa anti-nazi que lhe suporta ideologicamente o desejo de vingança - mas esta ambiguidade, when you fight scum you become scum, moral languiana por excelência, é o ponto de quase todos os filmes anti-nazis de Lang). Não comparemos o incomparável.
E dentro dessa coincidência, esta outra: a cena da morte do vilão de ambos os filmes (e abstraindo agora o inenarrável plano subjectivo da morte do de Tropa de Elite). Diz o Baiano, traficante da favela, quando tudo está perdido: "na cara não, para não estragar o velório" (se bem se percebe do tal plano subjectivo, o pedido não foi atendido). Ora, é na cara, justamente, que Quive-Smith (George Sanders), o nazi de Man Hunt, apanha com a flechada final de Walter Pidgeon. (Notar-se-ia que pouco antes da flechada também aqui houve um plano subjectivo, mas corresponde ao único ponto de vista eticamente possível, o de Pidgeon, e tem a função precisa de estabelecer, por assim dizer, a geografia da cena). Sem fazer, obviamente, nenhum pedido que o ridicularizasse aos olhos do executante. A partir daqui, não me sentisse eu pouco persistente comigo próprio, podia-se fazer um post sobre três coisas que me limito a deixar em tópicos: 1) o respeito pelo inimigo, que obviamente não implica estima, como ética perdida desde a II guerra; 2) o respeito pelo espectador e pelas personagens, que desejavelmente implica uma estima, como questão posta a nu pelo uso do plano subjectivo e intimamente ligada a todas as cenas de mortes de vilões; 3) a diferença entre um cineasta de tabloide e um cineasta ensaísta.
Sunday, July 27, 2008
Even worse than that
Ia deixar passar o assunto em claro, género tanto se me dá como se me deu, mas uma tal vaga obriga-me a pôr os pontos nos ii: há uma gralha na minha coluna do quadro de estrelas, e onde se contam duas à frente de The Dark Knight deve contar-se apenas uma. On ne badine pas avec la condescendence.
(e é, quase inteira, para, e por, Heath Ledger)
Tuesday, July 22, 2008
Tropa de elite
(a suivre)
Friday, July 18, 2008
On Cohen
Quem parece pecar por excesso, umas páginas mais à frente, é Beck, quando diz que Cohen parece escrever para gente que venha "daqui a mil anos". Talvez peque, mas é uma boa ideia: como com certos textos religiosos, é possível que as canções de Cohen precisem de esperar o tempo suficiente para se verem livres da referencialidade quotidiana e da possibilidade de serem cotejadas com o real de lugares, situações e relações vividas, imagináveis, e concretas. Para que então, libertas do circunstancial e do acessório, crepitem como puro pensamento, imaculada energia emocional, condensação de verdades essenciais sem tempo nem espaço.
Quanto a mim, confesso-me pouco disponível para o elogio de Cohen feito à luz de um qualquer ideal de masculinidade. É um conceito interessante, a masculinidade, mas um pouco sobre-usado nos dias de hoje -frequentemente como manifestação de uma "nostalgia autoritária", nalguns casos como sinal de uma mal resolvida vacilação homoerótica (acho que Gore Vidal escreveu umas coisas sobre o assunto, já nos anos 60).
Pelo contrário, em Cohen comove-me a posição de fragilidade (ou mesmo de dependência) emocional em que tantas vezes se coloca, uma fragilidade que é quase sempre infantil, quando muito adolescente (todo o drama da adolescência é este: o homem de 15 anos já é o homem de 75; ou, de outra maneira, o homem de 35 ainda é o homem de 15). Muitas das canções de Cohen evocam as linhas melódicas, simples, poderosas e hipnóticas, de canções infantis. De acordo, não são canções infantis: mas são uma imaginação, adulta, negra e um pouco tortuosa, de "canções de desembalar", trá lá lás feitos para sobressaltar em vez de para aquietar.
E, como em Cohen há mais para além de self-pity masculina a choramingar pelas negas das mulheres ou pelos amores desvanecidos, interessa-me o seu lado, digamos, equitativo, a capacidade de se pôr num ponto de vista exterior. Exterior a si, porque frequentemente fala por dois e há um drama comum a duas pessoas (One of Us Cannot Be Wrong, a mais genial after-breakup song alguma vez escrita). E exterior ao género, pela manifesta capacidade de incorporar, nem que seja narrativamente, a feminilidade. Acho que isto já devia ter sido dito há muito tempo: Cohen é o Mizoguchi dos "songwriters", e não existe puta de canção mais
mizoguchiana (se tolerarem o emprego do vernáculo como reforço do superlativo) do que The Stranger Song, versão cantada das Irmãs de Gion ou dos Crisântemos Tardios e de todas as outras histórias de mulheres que descobrem tarde demais que são elas, my love, são elas who are the stranger.
Resumida e desajeitadamente, eis porque gosto de Cohen. Mas nada de confusões com o mito do superhomem coheniano. Justamente o contrário: ele é o homem comum, com emoções comuns, que simplesmente encontrou as palavras (e as melodias) certas para as exprimir. Com as palavras certas, as emoções comuns tornam-se extraordinárias. E por se tornarem extraordinárias, nós, os que não encontrámos as palavras certas, podemos reconhecê-las como comuns. No fundo, isto é tudo bastante simples.
(sinceramente, L. Oliveira)
Monday, July 14, 2008
Céu negro
Para todos os que o perderam na semana passada, a sequência final do Cielo Negro de Manuel Mur Oti, incluindo um dos mais espantosos travellings que alguém foi capaz de fazer desde o Sunrise do Murnau (começa aos 3.35, o dito travelling, e vai até aos 5.56). Atenção aos sinos na banda sonora, que isto é cinema religioso, ****-se.
Dedicado aos que o perderam, como disse, mas especialmente ao cronista célebre (enfim, dizem-me que é um cronista célebre, eventualmente até bem pago), lido hoje na sala de espera do dentista, que com a mesma convicção com que o animal de palas nos olhos diz "para frente é que é o caminho" escreve que a expressão "cinema americano" é uma "redundância"; com a minha imensa inveja por não conseguir habitar o mesmo mundo simples e arrumadinho (ainda nos cruzávamos, arre).
Tuesday, July 01, 2008
Speed racer (ou André Bazin nas corridas)
Tuesday, May 27, 2008
Sydney Pollack
Os maniqueísmos deste tipo passam com o tempo, felizmente (ou infelizmente), e hoje não dedico nenhuma animosidade especial nem a Pollack nem aos seus apaniguados (tenho até muita estima pessoal por um grande admirador do The Yakuza, que, digo eu em defesa dele, pelo menos tem o Robert Mitchum). Acho apenas que Pollack, bastante lúcido na análise do que aconteceu ao "sítio" de Hollywood onde se quis instalar (conferir a lucidez neste obituário do New York Times), acabou por ser ele próprio, no seu moderado talento de cineasta e no condicionamento da sua ambição criativa, um sintoma do mesmo esvaziamento do "middle ground" de que ele se queixava.
Dito isto, tenho simpatia por alguns dos seus filmes mais antigos (They Shoot Horses, Don't They?, Jeremiah Johnson, The Electric Horseman), e gosto bastante de um dos últimos, Random Hearts, filme necrológico com uma tensão e uma violência (e um sublime Harrison Ford) praticamente inexistente no resto da sua filmografia.
Mas ainda que isto não fosse assim, guardaria uma calorosa memória pessoal de Sydney Pollack, e tanto assim que foi a primeira coisa de que me lembrei quando soube da sua morte. Em 1995 ou 1996 fui entrevistá-lo a um hotel de Lisboa, para aí o Ritz. Pollack andava em promoção de Sabrina, pálido remake (apesar das cores de Rotunno) de um dos poucos Wilders que nunca me encheu as medidas (a cópia em que sempre o vi não ajuda, é um facto). Nessa altura eu era um jovem impressionável e facilmente intimidável (hoje sou menos jovem), nada à vontade perante uma figura do mainstream de Hollywood, a partir da qual se conseguia chegar a Griffith sem esgotar os six degrees of separation (pelas minhas contas chega-se lá em cinco, mas eu fui por Jane Fonda e admito que indo por Robert Mitchum se atalhe caminho). Esta espécie de entrevistas é sempre a andar, e para não perder tempo com o crítico ou jornalista a entrar, a instalar-se, a ligar o gravador ou a abrir o bloco de notas, mal o entrevistado despacha um levanta-se e vai para o quarto ao lado, onde já está outro entrevistador a quem foram dados alguns minutos para ter tudo a postos e ir direito ao assunto assim que o entrevistado entre na sala. Eu tinha usado os meus vinte minutos com duas preocupações - não fazer perguntas idiotas, e sobretudo tentar lembrar-me de perguntas minimamente originais, que não obrigassem o homem a repetir o que tinha dito vinte minutos antes e voltaria a dizer vinte minutos depois. Pollack respondeu a tudo com simpatia e disponibilidade; mas, excelente actor (vejam-no no Woody Allen, no Kubrick, no Michael Clayton), até que ponto eram sinceros os picos de entusiasmo na voz e as pausas para pensar eu não conseguia perceber. Nem se a pose correspondia a uma atitude paternalista perante o miudo um bocado esmagado que o entrevistava.
Acabados os vinte minutos Pollack despediu-se, sempre simpático, levantou-se e saiu, a caminho da próxima entrevista. Já fora do quarto, estacou subitamente, virou-se para trás, deu dois passos para voltar a entrar e, com o sobrolho franzido e um braço ligeiramente estendido na minha direcção, disse: "Challenging questions!...". O cumprimento iluminou-me o dia - porque me pareceu sincero mas ainda mais porque tornava claro que ali estava um homem suficientemente sensível para perceber que em determinadas circunstâncias o entrevistador se sente mais examinado do que o entrevistado. Fiquei com esta certeza sobre Pollack: era um homem melhor do que os seus filmes. Garanto-vos que não conheço muitos realizadores de quem possa dizer o mesmo.
(O que vale o que vale: não mais, mas também não menos).
Thursday, April 24, 2008
I can hear music
Era genial, absolutamente genial. Ouvi-a.
Wednesday, April 23, 2008
A noite é nossa
Leio algures (algures não, na Time Out, que se lixe a falta de vontade de implicar) que ninguém acredita que Mark Wahlberg e Joaquin Phoenix sejam irmãos. Eu também não acredito. Mas acredito, vejo, constato, que Joe e Bobby Grusinsky são irmãos. Aliás, no Darjeeling do Wes Anderson também nunca acreditei que Owen Wilson, Jason Schwartzman e Adrian Brody fossem irmãos, embora acreditasse piamente nos irmãos Whitman. Podia dizer que em Blade Runner também não acredito por um momento que algum daqueles actores seja um "replicante". Mas... so what?
Saturday, April 19, 2008
E eu estou vivo
Michelangelo Antonioni, algures nos anos 50, em resposta a uma pergunta sobre a influência de Cesare Pavese nos seus filmes.
Thursday, March 27, 2008
Widmark
Típico actor americano do pós-II Guerra, Widmark tinha uma ambiguidade natural que o tornava excepcionalmente dotado para encarnar anti-heróis (também típicos do período 1945-55), como os protagonistas esquivos, sombrios, frios como répteis, do mundo fulleriano. Eis uma cena memorável de Pick Up On South Street (1953). De Samuel Fuller, evidentemente.
Wednesday, March 26, 2008
Mudanças no texto
Tuesday, March 04, 2008
Da crítica de cinema como prática cronométrica
(...)Fuller, lui, a tourné moins de cent plans, dont beaucoup de 1', 2' ou 2'30'', dont un de 3'29'' (le premier plan de bureau, où apparait la Teutonne tondue), un autre de 5'29'' (la dernière scène au bureau, terminée par la derouillée de Pittman), un autre enfin de 5'47'' (Bruno rentrant au bercail). Après ceux de Rope (Hitchcock, 1948), bien sûr, ces plans constituent le record mondial du cinéma digne d'interêt. En realité, les fameux plans de The Magnificent Ambersons (Welles, 1942), du Trou (Becker, 1960) et de Cronaca di un Amore (Antonioni, 1950) ne dépassent pas les 3'. Est-ce là un signe de recordite gratuite? Tout nous porte à le croire, car, lorsque l'on veut faire un filme en moins de quinze jours, l'on se limite aux plans de 1', 2' maximum, limite au-delá de laquelle la performance devient difficile et fatigante pour les acteurs et techniciens, susceptibles alors d'oublis, d'erreurs (sans parler des imprévus), qui sont en fait d'heureuses aubaines pour le véritabe artiste. Dans les petites firmes, ensuite, on coupe en dix ces plans-séquences, pour varier (sic). Ce parti-pris de recordite est finalement bénéfique: comme dans Run of the Arrow et son célèbre 4'11'', la caméra part d'un sujet sécondaire, se dirige lentement, par un mouvement dans l'espace assez marqué, vers le sujet essentiel de la scène. Nous trouvons alors (...) un certain nombre de petits recadrages sur les personnages et objets intéressants d'une savante souplesse expressive, et d'un incroyable adresse dans la présentation soudaine et efficace des rapports d'éléments imprévisibles. Il y en a cinq ou six dans le 5'47'' qui nous fait aller - ô! merveille - du dehors à l'intérieur sans aucune rupture, en suivant un étroit couloir (aucune fumisterie du type Pancinor n'est ici possible), il y en a douze ou treize dans le 5'29'', l'un des plus difficiles et l'un des plus chouettissimes plans que j'aie jamais vus. (...).
(Para comodidade do leitor, permiti-me destacar todas as passagens referentes a números; chamo ainda atenção para o maravilhoso "(sic)" a seguir a "pour varier"; e esclareço, para melhor compreensão, que "Pancinor" era a marca da lente que, de 1959 em diante, permitiu a popularização da impressão puramente óptica de movimento a que chamamos "zoom").
Tuesday, February 19, 2008
O valente soldado Schumann
Já viram esta foto dezenas de vezes, com certeza. É uma das imagens mais célebres da guerra fria - pelo menos da guerra fria vista do lado de cá. Mas talvez não saibam que o soldado se chamava Conrad Schumann, e era um jovem saxão de 19 anos. Tinham-lhe pedido que ficasse de guarda naquela fronteira de arame farpado, nas primeiras horas do encerramento da fronteira entre Berlim ocidental e oriental. Com pouca ou nenhuma instrução política - ou, o que será mais certo, com reduzido entendimento da instrução política que lhe deram - nem percebia muito bem o significado daquela fronteira. Pediram-lhe que a guardasse, e que não deixasse ninguém atravessá-la. E era isso que ele fazia. Mas o que o soldado Schumann não percebia de todo era por que raio havia, dos dois lados do arame farpado, grupos de gente a insultá-lo (se houvesse apenas de um lado, tudo seria mais fácil de compreender). Ofendido e enervado, reparou que a certa altura, do lado ocidental, os insultos se transformaram em incentivos: "salta! salta!". A tentação começou a crescer dentro dele, e a certa altura, saltou.
Nunca soube explicar, foi um impulso súbito. Nem sabia exactamente, na altura, qual a troca que fizera ao saltar por cima do arame farpado. Foi um gesto instintivo, quase infantil, que só as circunstâncias transformaram num gesto político significativo. E o soldado Schumann, de resto, viveu sempre com incómodo o seu estatuto de símbolo da guerra fria. Como se, no fundo, alguma coisa dele tivesse ficado emaranhada no arame farpado, e depois emparedada no muro que veio substituir o arame farpado. Quando o muro caiu, essa parte do soldado Schumann, em vez de se libertar, caiu também. Entrou em depressão, que se foi agravando. E um dia, aos 56 anos, o soldado Schumann enforcou-se no jardim da sua casa.
O que me agrada (ou enfim, o que me comove) nesta história é ela realçar muito bem a descontinuidade entre o político e o pessoal. E que o gesto do soldado Schumann, tão devorado pela política, seja no fundo uma demonstração de que nem tudo é política. Ou por outra, que há um reduto individual, íntimo, onde a linearidade de uma interpretação política se suspende ou se vira do avesso.
Sim, porque imaginam o maná que isto - um símbolo do "mundo livre" morreu com uma depressão - não seria para a propaganda comunista, houvesse ainda o "bloco de leste" quando Schumann se suicidou?
Friday, February 15, 2008
The perception of doors
Coisa bem diferente são os planos e as cenas em que as portas são tudo. Em que sem portas não havia filme. O maior "cineasta de portas" foi, claro, Lubitsch. (Lembrei-me de Pedro Costa porque nos últimos Cahiers chamam a Juventude em Marcha um "filme de portas", ideia interessante [mas eu talvez lhe chamasse antes um "filme de paredes", sendo certo que as portas são muito importantes em quase todos os filmes de Pedro Costa, por exemplo as portas que não há em Casa de Lava, ou aquelas em cuja soleira se instala Straub no filme do Sourire Enfoui]).
Isto tudo para dizer que boas cenas com portas a abrir e a fechar são coisa rara. Quando se vê uma é uma alegria. O último Rivette, Ne Touchez Pas la Hache, tem uma magnífica: o Marquês de Montriveau (genial Guillaume Depardieu, feito bête seule) arrastando a perna postiça pelas divisões da casa da Duquesa de Langeais (Jeanne Balibar, toda obstinação quebrantada, se se diz assim), abrindo todas as que encontra pelo caminho, numa barulheira bestial. Três, quatro planos, muito curtos, onde a percepção das portas é tudo.
Wednesday, February 06, 2008
The day manhood died
O final de Vera Cruz, Robert Aldrich, 1954. Ou, cf. post abaixo, a morte da masculinidade. Ou whatever.
Se o diz
A line mais divertida de Myra Breckinridge, famoso monstro involuntariamente gerado no ventre de Gore Vidal, se estiverem em dia de tolerar metáforas orgânicas de gosto duvidoso. Não sei se a frase foi importada do romance ou se resultou da lavra dos adaptadores. Mas soa-me vidaliana, embora me espante a pouca consideração do homem por Gary Cooper. Mas enfim, não sou eu que me vou pôr discutir hierarquias da masculinidade com Gore Vidal.
Monday, January 28, 2008
Antes de La Ciotat
Wednesday, January 16, 2008
Take this longing
Queen Christina, de Rouben Mamoulian, também é de 1933. Mas aqui as alusões são de outra espécie (vide o cacho de uvas). Nesta cena, Garbo, rainha cansada de ser um "símbolo" e uma "abstracção" e com muita vontade de poder ser um "corpo" e ma "alma", põe-se a tactear as paredes e os objectos, autenticamente "para memória futura". Acho esta cena um ponto alto do génio metonímico de Mamoulian, da graciosa sensualidade neurasténica da Garbo (ah, aquele grande plano), e, claro, da espécie de franqueza erótica da Hollywood dos thirties. Também acho que, sem demasiado trabalho retórico, a partir desta cena se podia fazer uma ponte entre a sueca Garbo e algumas das futuras e igualmente suecas heroínas bergmanianas.
(se tiverem a tarde livre, não percam: é um filme genial)
Tuesday, January 15, 2008
Outros Mabuses
Thursday, January 10, 2008
Auto-centramento
Não era do que ia à procura quando fui buscar a Trafic nº37, mas dei com um belo texto de Frédèric Bonnaud sobre a "crise da crítica" em França. Não é muito diferente da "crise da crítica" noutros sítios, o fenómeno é, como se diz, "global". Gosto muito de Bonnaud, julgo que é o melhor crítico de cinema francês da minha geração (se for verdade que nasceu em 1967 só tem mais três anos do que eu). Mas justamente por ser desta geração, por ter começado a escrever com vinte e poucos anos (como eu), a "crise da crítica" foi o panorama em que cresceu e que sempre conheceu. O texto é genialmente agudo no desenho e identificação dos contornos da "crise", mas o facto de esse ser o ar que sempre respirou permite-lhe, se não desdramatizar, chegar a conclusões invejavelmente serenas, para uso individual mais do que colectivo. É que, com "crise" ou sem ela, pode-se sempre tentar escrever bons textos sobre filmes. Talvez não seja muito, mas também não é assim tão pouco.
As outras merdas
Wednesday, January 09, 2008
Bandas sonoras
Saturday, January 05, 2008
As premonições de Fritz Lang
O Testamento do Doutor Mabuse
Tudo é impressionante no Testament. Da mise en scène geometricamente gélida à cenografia discretamente cavernosa. O som, por exemplo, a bruitage abstracta assente em elementos concretos – e Lang foi, com Renoir (cineasta quase nos seus antípodas) quem mais explorou, nesses primeiros anos do sonoro, a utilização do som como interrupção do naturalismo a que essa novidade técnica parecia destinada.
Ouve-se a “sinfonia industrial” que é a banda sonora do Testament e percebe-se bem que tenha sido naquela cidade, Berlim, que cinquenta anos mais tarde apareceram os Einsturzende Neubauten. E esta é a menor das premonições de Lang. Das Testament antecipa o nosso mundo, um mundo sob a égide do “terror” tal como foi redefinido pela escala do 11 de Setembro. Está longe de ser o menos impressionante do filme de Lang. Aquela página das anotações de Mabuse, onde está escrita, em letras grandes, esta fórmula: “dominação pelo terror”. A ambiguidade (ambiguidade languiana e ambuiguidade nossa contemporânea) está nisto: se é claro a quem compete praticar o terror, saber a quem aproveita o terror é mais obscuro. Quantas lideranças políticas actuais (na Europa como na América como na Ásia) não extraiem autoridade da ameaça terrorista, não exploram o “terror” como instrumento de “dominação”? Como bem explicita o filme de Lang, pouco importa se o Dr Mabuse está morto e enterrado; o que é preocupante é a vida do seu testamento.