Monday, June 11, 2007

O estilo de Rembrandt

Folheando o livro do post abaixo (a edição portuguesa), em que já não pegava desde a faculdade, reencontro uma história deliciosa. Um filme em que Cecil B. DeMille se entusiasmou com uma experiência de iluminação, que deixava parte dos planos na penumbra e fazia a luz incidir apenas sobre metade dos rostos dos actores. Mandado o filme para a distribuidora, recebeu um telegrama: "Endoideceu? Julga que posso vender o filme pelo preço inteiro quando mostra apenas a metade de um homem?". Com o filme a ser rejeitado em todo o lado, DeMille recorreu à guerra psicológica e enviou, por sua vez, um telegrama: "Se vocês são tão ignorantes que não reconhecem um claro-escuro de Rembrandt quando estão a ver, pelo menos não me atribuam as culpas". Funcionou: o distribuidor promoveu o filme com o slogan "O primeiro filme iluminado no estilo de Rembrandt!".


Mas eis a conclusão a que Arnheim chegava: "Esta história mostra até que ponto a nossa maneira de ver se modificou nestes últimos anos. Hoje em dia, o grande público está habituado aos efeitos de luz (...). Mas, nesse tempo (...) qualquer intrusão formativa era considerada uma detracção do realismo da natureza, isto é, do objectivo fundamental do filme. (...) Deviam colocar-se as luzes de tal modo que todos os pormenores de todos os objectos se pudessem ver claramente; não queriam sombras perturbadoras, mas sim uma perspectiva clara".


Isto foi escrito em 1932, ou quando muito em 1957. Não sei se, em 2007, Arnheim poderia estar tão seguro sobre a modificação da "maneira de ver", e muito menos sobre a disponibilidade para as "sombras perturbadoras" em detrimento da "perspectiva clara".

Rudolf Arnheim (1904-2007)

A primeira edição de O Cinema como Arte (ou, na tradução portuguesa das Edições de 70, A Arte do Cinema), saiu em 1932, ainda na Alemanha. Depois, nos anos 50, já Arnheim vivia nos EUA, houve uma revisão e actualização (e não estou certo de que não tenha havido ainda mais uma).


É um marco na bibliografia sobre cinema. Não apenas uma proclamação e defesa do cinema como arte, mas uma das primeiras tentativas teoricamente sustentadas e sistematizadas de defesa do cinema como arte não-naturalista.


Arnheim foi um dos primeiros a defendê-lo. Privilégio de uma longevidade de quase 103 anos, também se pode dizer: foi um dos últimos a defendê-lo.

Tuesday, June 05, 2007

Num mundo perfeito

Num mundo perfeito não se fariam filmes com crianças que não fossem remakes de Moonfleet ou de Night of the Hunter.


(por nenhuma razão especial, é só porque doutra maneira não vale a pena; todos os filmes bons com crianças nos últimos trinta ou quarenta ou anos são remakes ou dum ou doutro, e nos melhores casos dos dois ao mesmo tempo)


(e aos iranianos, que só fazem remakes do Night of the Hunter, dir-se-ia apenas: continuem)