Folheando o livro do post abaixo (a edição portuguesa), em que já não pegava desde a faculdade, reencontro uma história deliciosa. Um filme em que Cecil B. DeMille se entusiasmou com uma experiência de iluminação, que deixava parte dos planos na penumbra e fazia a luz incidir apenas sobre metade dos rostos dos actores. Mandado o filme para a distribuidora, recebeu um telegrama: "Endoideceu? Julga que posso vender o filme pelo preço inteiro quando mostra apenas a metade de um homem?". Com o filme a ser rejeitado em todo o lado, DeMille recorreu à guerra psicológica e enviou, por sua vez, um telegrama: "Se vocês são tão ignorantes que não reconhecem um claro-escuro de Rembrandt quando estão a ver, pelo menos não me atribuam as culpas". Funcionou: o distribuidor promoveu o filme com o slogan "O primeiro filme iluminado no estilo de Rembrandt!".
Mas eis a conclusão a que Arnheim chegava: "Esta história mostra até que ponto a nossa maneira de ver se modificou nestes últimos anos. Hoje em dia, o grande público está habituado aos efeitos de luz (...). Mas, nesse tempo (...) qualquer intrusão formativa era considerada uma detracção do realismo da natureza, isto é, do objectivo fundamental do filme. (...) Deviam colocar-se as luzes de tal modo que todos os pormenores de todos os objectos se pudessem ver claramente; não queriam sombras perturbadoras, mas sim uma perspectiva clara".
Isto foi escrito em 1932, ou quando muito em 1957. Não sei se, em 2007, Arnheim poderia estar tão seguro sobre a modificação da "maneira de ver", e muito menos sobre a disponibilidade para as "sombras perturbadoras" em detrimento da "perspectiva clara".